19/06/2010

Ontem morreu Saramago e pouco passava do meio-dia

A minha relação com Saramago é a mais genuína que pode existir. Não nascemos a gostar, aprendemos a fazê-lo. Levei anos, sim, foram anos para continuar a ler o Ensaio sobre a Cegueira que iniciei mal foi publicado. Mas a leitura, a minha leitura, não fluía e muito menos acompanhava aquele maralhal de palavras órfãs de pontuação, frases curtas, claras e concisas. Fruto da minha eterna teimosia, quando a peça estreou no S. João pel'O Bando fui ver o que terminou madrugada alta com a leitura desde sempre deixada nas primeiras páginas.
Devoro leitura, mas nem sempre com a avidez com que deveria, que nem tudo tem bonecos ou frases fáceis cor-de-rosinha. O mais das vezes a preto&branco, o início de tudo, é a cor que as acompanha. Mas aprendi a gostar de Saramago e voltarei ao antigo, a Todos os Nomes e ao Ano da morte de Ricardo Reis. Bem como ao início, com a Terra do Pecado que afinal nem sequer é vermelha...
Num imenso mundo de if's e aparências, cada vez mais tenho a certeza que já somos cegos no momento em que cegámos, tal qual a alegoria da caverna.
Saramago não foi o responsável por trazer a luz e muito menos encarreirar a pontuação algures perdida. Mas a nitidez, uma outra nitidez que não sei descrever mas de que gosto muito, assim para bastante, foi trazida com a sua escrita. Quer queiramos ou não, eterna. E é bem verdade, Se podes olhar vê. Se podes ver, repara.
"Hoje eu estou aqui e amanhã não estarei. É o que tem de chato."

3 comentários:

Fer disse...

Olá
Acabo de ler o teu post via rss.
Roubei o link do video para o meu blog :)
Deixo-te outra frase deste senhor "Já a amava antes de a conhecer"

Dylan disse...

José Saramago não era menos português por não pôr a bandeira à janela na véspera de um evento desportivo. Acima de tudo, a sua essência era ibérica. Convém dizer que só saiu de Portugal devido à ostracização de Sousa Lara, comprovada agora com o episódio político revisionista da não presença de Cavaco Silva no seu funeral. "Viagem a Portugal" é reflexo de amor e do encantamento que sentia pelo país, pela sua beleza e cultura, pela classe trabalhadora, espelhada na sua identidade, mesmo que isso significasse ir contra a ideologia do seu partido, contra a maioria religiosa, contra o politicamente correcto. Para o seu espírito inconformado, a morte é pouco relevante. Como diria Saramago, "o fim duma viagem é apenas o começo de outra".

Unknown disse...

Será que ninguém entende? SARAMAGO NÃO MORREU! Nós não perdemos Saramago! O teríamos perdido, se ele não tivesse existido, porém seus escritos "SÃO" e "SERÃO", sendo assim ele continua existindo!